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Tecnologia do Pescado
24 de Fevereiro de 2025 Alex Augusto Gonçalves
A cor do pescado: O que devemos saber?

A cor do pescado é um fator importante tanto para a qualidade visual quanto para a aceitação do produto. Cada espécie possui uma coloração característica, que pode variar de acordo com fatores como habitat (melanina na pele, crucial para proteção, camuflagem e adaptação ao ambiente) e dieta (coloração muscular). Quando abordamos coloração da musculatura da carne dos peixes, esta pode variar de branca, cinza, amarela, vermelha a laranja, principalmente devido à presença de pigmentos carotenoides. 603w4f

 

 

Além desses fatores naturais, a forma como o peixe é armazenado e processado também pode afetar sua cor. Peixes frescos geralmente têm uma coloração mais vibrante, e a perda de cor pode ser um indicativo de deterioração, o que torna a avaliação visual uma parte importante do controle de qualidade. Durante o cozimento, proteínas e pigmentos podem sofrer alterações, impactando a cor final. Ressalta-se que, nos peixes, a mioglobina (Mb), uma proteína globular presente no tecido muscular, é responsável pela cor da carne, e é afetada também pela presença ou ausência de oxigênio, que dependendo do tipo de tecnologia empregada ou embalagem utilizada, poderá afetar a coloração da carne. Um exemplo é a carne do atum, que quando é fresca e exposta ao oxigênio, a mioglobina oxigenada dá à carne crua uma cor vermelho-viva. À medida que a carne envelhece ou é cozida, a cor muda devido à oxidação do ferro presente na molécula da mioglobina, tornando-se mais escura (marrom).

 

 

 

Outro exemplo de coloração diferenciada da carne de peixe é o Lingcod (Ophiodon elongatus), que apresenta uma coloração única, resultante de uma mutação genética e de pigmentos biliares (biliverdina), e não de pigmentos carotenoides. Entretanto, ao ser cozida, a carne volta a ser esbranquiçada.

 

 

Já, nos crustáceos, o pigmento carotenoide - astaxantina, em seu estado natural, está ligado a proteínas (carotenoproteínas), gerando uma variedade de cores, incluindo amarelo, vermelho, laranja, marrom, verde, azul, violeta, entre outras. Quando ligada a proteínas, a astaxantina forma compostos como α, β e γ-crustacianina (responsável pela coloração azul da carapaça das lagostas), ovoverdina (pigmento verde em ovas de lagosta) e zeaxantina (pigmento amarelo em ovas de peixes).

 

 

É importante destacar aqui que os crustáceos têm a capacidade de converter β-caroteno em astaxantina e ligá-la a uma proteína. No entanto, durante o cozimento, essa proteína é desnaturada, fazendo com que a cor laranja-avermelhada do pigmento livre se torne evidente.

 

 

É fundamental destacar que, com o crescimento da aquicultura global, surgiu a necessidade de adicionar pigmentos carotenoides, como cantaxantina e astaxantina, na alimentação das espécies como salmão, truta e camarão, que são muito valorizadas pela sua aparência. Isso é essencial para garantir que a coloração da musculatura dos peixes, especialmente dos salmonídeos (salmão e trutas), se aproxime da dos indivíduos selvagens. Em cativeiro, os peixes não têm o aos organismos naturais que fornecem esses pigmentos, o que impacta diretamente na coloração da carne. Assim, os produtores podem modificar a cor do músculo dos peixes conforme a quantidade de pigmentos na ração. No entanto, isso tem gerado confusão entre os consumidores, que podem acabar comprando salmão cultivado rotulado como selvagem ou truta sendo vendida como salmão.

 

 

Ressalta-se que a pigmentação dos peixes ocorre porque eles não são capazes de sintetizar carotenoides endogenamente, precisando obtê-los através da dieta. Além da coloração, a astaxantina oferece benefícios antioxidantes que podem melhorar o sistema imunológico do peixe e reduzir o estresse oxidativo. A diferença entre o salmão de cultivo com e sem adição de astaxantina na alimentação ilustra a importância do pigmento para garantir a coloração e a qualidade sensorial esperadas pelos consumidores.

 

 

Embora a astaxantina ocorra naturalmente em microalgas e crustáceos, ela também pode ser obtida a partir de outras fontes biológicas ou por meio de síntese química. A produção em larga escala de astaxantina pode ser feita por meio do cultivo de microalgas em fotobiorreatores, que utilizam luz solar ou artificial para estimular a produção de pigmentos. O cultivo de Haematococcus pluvialis é a fonte mais eficiente de astaxantina natural, sendo uma prática mais sustentável em comparação com a síntese química. A astaxantina também pode ser produzida sinteticamente, um processo mais barato e amplamente utilizado na aquicultura. Embora as moléculas sintéticas tenham a mesma estrutura que as naturais, o processo gera isômeros que não ocorrem na natureza. A astaxantina sintética é considerada menos eficiente biologicamente em termos de biodisponibilidade e efeitos antioxidantes.

Há preocupações em relação à toxicidade da astaxantina para o consumidor. A astaxantina natural, derivada de fontes como Haematococcus pluvialis, é considerada segura para o consumo humano e, além de não ser tóxica, apresenta benefícios à saúde, como melhora da função imunológica e potente ação antioxidante, superando outros carotenoides, como o betacaroteno, na capacidade de neutralizar radicais livres. Embora a astaxantina sintética seja amplamente usada na aquicultura, há preocupações sobre possíveis diferenças de segurança entre a versão natural e a sintética. Estudos indicam que a versão sintética pode não ser tão eficaz biologicamente quanto a natural. No entanto, a toxicidade da astaxantina sintética em níveis comuns de consumo é considerada baixa.

 

 

Por fim, entender a cor do pescado e seus determinantes é fundamental para a qualidade do produto e a satisfação do consumidor. A coloração não é apenas uma questão estética, mas também um indicativo de frescor e qualidade do alimento.

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Alex Augusto Gonçalves

Oceanógrafo (FURG – 1993), Mestre em Engenharia de Alimentos (FURG – 1998), Doutor em Engenharia de Produção (UFRGS – 2005) e Pós-doutor em Engenharia (Dalhousie University, Halifax, Canada – 2008). Foi professor do curso de Engenharia de Alimentos (ICTA/UFRGS e UNISINOS), coordenador adjunto do Curso Superior em Gastronomia (UNISINOS), professor e pesquisador no Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal, da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), do Programa de Pós-Graduação em Nutrição (PPGNUT/UFRN) e do Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade e Ecologia Marinha e Costeira (PPG-BEMC/UNIFESP). Hoje é Professor Associado IV no curso de Engenharia de Pesca, Chefe do Laboratório de Tecnologia e Controle de Qualidade do Pescado (LAPESC/CCA/DCA/UFERSA), responsável pelas disciplinas de Tecnologia do Pescado I e II, Tecnologia, Inspeção e Controle de Qualidade do Pescado, e Pesquisa e Desenvolvimento de Novos Produtos da Pesca e Aquicultura. Foi Bolsista Produtividade em Pesquisa (PQ) CNPq – nível 2 (2017-2019), e Editor Associado – Brazilian Journal of Food Technology (2014-2019). Consultor Ad hoc de revistas nacionais e internacionais, revisor Ad hoc de Projetos de Pesquisa e Extensão, e consultor internacional da FAO/ONU. Editor do Livro “Tecnologia do Pescado: ciência, tecnologia, inovação e legislação” (2ª. Ed) premiado em 2º Lugar na Categoria “Tecnologia e Informática”, no 54º Prêmio Jabuti 2012. Encontra-se desde 2019 cedido ao Ministério da Agricultura e Pecuária. Foi Coordenador-Geral da Pesca Continental (SAP/MAPA), Coordenador-Geral de Monitoramento da Pesca e Aquicultura (SAP/MAPA), Diretor Departamento de Pesca (SAP/MAPA), Gerente de projetos do Escritório de Gestão de Projetos (SAP/MAPA), Assessor Técnico Especializado do Departamento de Produção Sustentável e Irrigação (DEPROS/SDI/MAPA), Chefe do Serviço de Transparência e Fomento (DEPROS/SDI/MAPA), Chefe do Serviço de Ouvidoria e Transparência (Ouvidoria/MAPA), e atualmente Coordenador da Coordenação de Ouvidoria e Transparência da Ouvidoria/MAPA.

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